domingo, 27 de fevereiro de 2011

A última comitiva



Ao meu sogro, José Gomes Pereira - “José Moura” –
com quem pude aprender que um homem não se faz pelo o que ele tem, e sim, pelo o que ele é.

O alforge comprimia-lhe o peito.

Na parte anterior trazia sua expressão máxima na frase do filho:_ “Como é difícil ser filho do meu pai”! No posterior o rasto de trabalho, decência, honradez e estima de todos os que com ele conviveram.

Na velha guaiaca de couro surrada, valores diferenciados: filhos encaminhados na vida cada qual com a graduação que escolhera, sem perder a humildade e a polidez ensinadas como uma maneira correta de enfrentar os desafios da vida.

Nas polainas as marcas de um bandeirante.

O velho berrante silenciado.

As esporas “crioulas” servindo de decoração para a sala de visitas.

Na confusão metal, refuga a montar na mula “Princesa”, que o acompanhou por mais de 20 anos, alegando que ela estava “lisa” e que iria pular. Pela primeira vez, o velho peão receava um animal.

Ao que o tempo passava, deixava de falar na fazenda, no gado, nos animais, nos carneiros e nas palmeiras que numa manhã de janeiro haviam balançado suas folhas como que numa despedida de adeus.

Uma fumaça branca, como a de um extintor de incêndio acionado, rasga quarto adentro.

Na frente, a mula “Princesa” arreada como tal, onde o peitoral acompanhando a cabeçada exibia o couro cru muito bem esticado e trançado, com suas argolas em número de 15 formando um belo desenho, dando graça e beleza a montaria.

Pára diante do “Comissário” agonizante.

Não houve hesitação.

A mula “princesa” recebe seu cavaleiro e segue o destino traçado desde antanho.

Num andar de passadas sincopadas, ao som do cincerro amarrado no pescoço da “égua madrinha” por uma correia fina, dá os primeiros passos à sua última viagem.

O “ponteiro” segurando o berrante com a mão esquerda emite aos céus “um repicado” em forma de “réquiem”, anunciando o oficio da partida.

Os “rebatedores” com os chapéus sobre o peito em sinal de respeito fazem o sinal da cruz como despedida ao que veio do pó e ao pó estava retornando.

Na retaguarda os “peões da culatra”, repetem o mesmo ritual dos rebatedores; e por fim, os peões da “culatra manca”, que, sem nenhum animal com cansaço, ferimento ou doença para cuidar, fecha a comitiva cujo destino é juntar-se ao “cozinheiro”, que se distanciava à frente, com os “burros cargueiros” em cujas bruacas, nada de alimentos, mas a certeza do dever cumprido.

Luiz Humberto Carrião

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