sábado, 5 de fevereiro de 2011

Pau de sebo


Na minha idade, 58, a relação entre o homem e divindade, notadamente a submissão do primeiro em relação à segunda, vai desmaiando no tempo, deixando um rasto trágico sobre o que vale a vida.

Tal qual uma pedra de amolar, a vida desgasta-nos independentemente do metal que fomos feito (royalties a George Bernard Shaw). Daí, pouco adianta a divindade se a hora chegou. Não importa mais o desejo de possuir ou o medo de perder o que se possui. A infelicidade não se instala pelo desejo ou pelo medo, mas pela certeza de validade vencida.

Geriatra, janúvia, lozartana, anlodipina, atenolol, nexion, rivotril, lexapro! De nada adianta. O caminho é uma próstata comprometida, os diabetes alterados, a pressão arterial descompensada, o cardiologista, os conselhos para as caminhadas, abstinência do álcool e do tabaco, cardápio a base de verduras e carnes brancas. Doces, coca-cola, sorvetes, nem pensar! Nem o útero que gerou ou a mama que amamentou são poupados. Uma desdita!

A divindade, irmã siamesa do ser humano, nasce com o parto. Faz parte do processo evolucionista Darwiniano. Mora no cérebro. Mesmo sendo tida como criadora e mantenedora de todo o Universo, tem suas limitações. Limitações necessárias e imprescindíveis à sua administração.

Qual o objetivo da vida senão criar a melhor defesa contra a morte (royalties a Primo Levi)? Foi a divindade quem quis! Você está passando por uma provação, persevera! São resgates de vidas passadas, acredite! Enquanto isso, adorada e venerada pelos humanos, promove um verdadeiro festival de desigualdade e sofrimento entre suas criaturas.

Ah! Doce ilusão. Não vais além de um pau de sebo com uma nota falsa na ponta (royalties ao saudoso professor Paulo Afonso Carneiro). Prazer para concebê-la, sofrimento para parir e dor para partir.

Para onde? Não sei.

Texto: Luiz Humberto Carrião
  

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